terça-feira, 1 de abril de 2008

Câmara Técnica de Medicina Legal reitera veto à atividade do médico legista em delegacias

Membros da Câmara Técnica de Medicina Legal reuniram-se esta quinta-feira (27), na sede do Conselho Federal de Medicina, para tratar do descumprimento, por parte de alguns estados brasileiros, da determinação do Conselho Federal de Medicina, que veda ao médico legista exercer suas atividades em locais como delegacias de polícia, quartéis e presídios. A determinação é estabelecida pela Resolução CFM nº 1635/2002 e pelo Parecer CFM nº 23/2005.

A resolução 1635 estabelece, em seu artigo segundo, que “é vedado ao médico realizar exames médico-periciais de corpo de delito em seres humanos contidos através de algemas ou qualquer outro meio, exceto quando o periciando oferecer risco à integridade física do médico perito”. O parecer, por sua vez, veda a atividade do médico legista em locais como delegacias de Polícia, presídios, etc.

Foi discutido ainda o questionamento a respeito do concurso para perito médico-legista da Polícia Civil do Distrito Federal. Segundo o presidente da presidente da Associação Brasileira de Medicina Legal (ABML), Luis Carlos Cavalcante Galvão, a ABML reconhece irregularidades, mas como entidade não pode interferir. Os candidatos estão sendo orientados a acionar a Justiça.
A respeito do descumprimento da resolução, Galvão diz que os Conselhos Regionais estão sendo contatados para apurar os casos.


A reunião foi coordenada pelo presidente da Associação Brasileira de Medicina Legal (ABML), Luis Carlos Cavalcante Galvão. Estiveram presentes o vice-presidente da ABML, Gerson Odilon de Pereira; o presidente do Conselho Técnico-Científico da ABML, Railton Bezerra de Meloior; o 2º corregedor do Conselho Regional de Medicina do Ceará, José Albertino Souza; o conselheiro do CRM-PR, Carlos Ehlke Braga Filho; e o representante do Conselho Regional de Medicina Rondônia, Manuel Lopes Lamego.

Fonte: Portal do CFM

ARTIGO - "Recursos Humanos na Medicina Legal: Quantidade de profissionais por habitante"

Anelino J. de Resende*

Em Março de 2004 um grupo criado pela Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, elaborou um projeto para Modernização da Perícia Oficial. Na parte referente a Recursos Humanos na Medicina Legal ele concluía que apesar de haver grandes variações na relação número de médico-legista e a população (20.000 no Tocantins e 300.000 na Bahia), em quase todos os Estados a Quantidade de Médicos Legistas era insuficiente para a demanda existente.

Havia Estados em que um legista era obrigado, a realizar até 16 necropsias por dia, o que impedia qualquer possibilidade de se fazer um laudo de boa qualidade sendo grandes as chances de que lesões internas passassem despercebidas ou não fossem descritas corretamente.

Não é necessário enfatizar o prejuízo que isso traz para a punição dos culpados, abrindo brechas que facilitam o questionamento dos laudos e impunidade dos culpados.

A grande maioria das cidades do interior não possui Médicos Legistas. No rio Grande do sul, por exemplo, um dos estados com maior quantidade de médico-legistas per capita, de um total de 497 municípios apenas 37 estão beneficiados com a presença destes profissionais. Um total de 4.472.137 habitantes estão sem assistência da Perícia Médico Legal. Em média há um profissional por cada 87.075 habitantes. Estudos em 10 outros estados mostram uma média de 135.491.

Considerando as capitais de dez estados esta média passa para 193.780 médicos por habitantes.


Gráfico mostrando a média do número de médicos por habitante



Gráfico mostra a quantidade de médicos legistas existentes por habitante em diversos estados e a média da quantidade de Laudos elaborada por cada um.



A partir deste estudo, a Associação Brasileira de Medicina Legal passou a recomendar que levando em consideração os índices de violência em baixo, médio e alto recomenda-se que haja um número mínimo de um médico Legista para cada 50.000, 30.000 e 20.000 habitantes Respectivamente.

*Membro do Grupo “Modernização da Perícia Oficial no Brasil” (SENASP/MJ, março de 2004)

ARTIGO - "O status moral do embrião humano"

José Geraldo de Freitas Drumond

O progresso científico é responsável por uma das mais graves realidades de nossa época: a de que o homem penetrou, definitivamente, nos insondáveis mistérios da vida e da morte, por meio de procedimentos tecnológicos que alcançaram a prática cotidiana, sem que houvesse uma precedente e adequada reflexão moral.

Nos dias atuais, em que prevalecem sociedades pluralistas, princípios e valores morais variam em razão de distintas culturas, através dos chamados “estranhos morais”, designação cunhada pelo filósofo norte-americano Tristram Engelhardt Jr. Soma-se a isso o impacto propiciado pela tecnociência, ocasionando mudanças significativas no conceito de diversos processos biológicos, notadamente aqueles que caracterizam os extremos da vida biológica, ou seja, o nascer e o morrer humanos.

Nessas situações perpassam a definição de início da vida humana e o conceito de pessoa, sujeito moral e detentor de direitos. Para Fernando Lolas Stepke, Diretor do Programa Regional de Bioética da Organização Pan-Americana de Saúde no Chile, “o momento em que se inicia realmente o ser humano pareceria ser matéria técnica, mas, todavia, esta não é uma pergunta respondível só com argumentos técnicos. É mais. Os argumentos chamados técnicos tendem a ser petrificados em dogmas ou cumprir a função de apoiar doutrinas”.

Esta questão se converge, pois, para a definição do status moral do embrião humano. Ludger Honnefelder, filósofo e Professor Emérito da Universidade de Bonn, Alemanha, assevera que o ser humano possui um valor absoluto, de acordo com a interpretação axiológico-metafísica, e o mesmo se dá com o ser humano ainda não nascido. Para Immanuel Kant, toda pessoa humana é titular de uma dignidade própria, que significa um bem incomparável a outros bens porque possui não um valor relativo que pode ser equiparado a outros, senão um valor intrínseco.

O ser humano é detentor de um patrimônio moral e legal, ou seja, um agente moral que determina o seu destino; aquele que, no entender de Kant, é um fim em si mesmo. Ou, como diria José Ortega y Gasset, o homem é ele e as suas circunstâncias: os seus genes e o destino que escolhe cumprir.
E se o homem é, intrinsecamente, pessoa dotada de dignidade e sujeito moral, não há porque definir esta dignidade na dependência de cumprir determinadas etapas biológicas do seu desenvolvimento: ou ele é no todo humano e digno ou não é, pois a capacidade de ser sujeito não é suscetível de verificação empírica.

Pondera Honnefelder que “se o status de pessoa corresponde a todo indivíduo da espécie humana, então se deve datar seu começo no momento em que o indivíduo começa a ser. Entretanto, o momento em que um indivíduo da espécie humana começa a ser é uma questão empírica. Isto é atestado pela moderna embriologia: com a formação de um novo genoma, mediante a fusão do núcleo de um óvulo com um espermatozóide começa um novo ser vivo, cujo desenvolvimento até a maturidade é determinado por seu próprio genoma. Então, supondo que as condições naturais o permitam, um ser humano, em sua forma madura, se desenvolve a partir do mesmo óvulo fertilizado.

Posto que todas as mudanças a serem observadas no desenvolvimento desse ser vivo constituem etapas de sua própria biografia, resulta arbitrária qualquer hipótese que pretenda que a índole de pessoa se circunscreva ao ser humano somente a partir de uma dessas etapas”. Daí porque nunca é demais reafirmar que a realidade humana não pode estar confinada ao seu desenvolvimento biológico, como se fora uma mera loteria genética realizada ao acaso. Os seres humanos são aqueles que possuem a forma desenvolvida do sujeito; um ser humano é pessoa e agente moral, possuidor de dignidade própria porque tem qualidades que são inerentes somente aos seres humanos e a mais nenhum outro ser vivo.
jdrugon@uol.com.br
* Publicado no Jornal Hoje em Dia – 17.03.2008